terça-feira, 22 de novembro de 2011

COLL, César; MAURI, Teresa; ONRUBIA, Javier. A incorporação das tecnologias da informação e da comunicação na educação: do projeto técnico-pedagógico às práticas de uso COLL, Cesar;MONEREO, Carles. Psicologia da educação virtual: aprender e ensinar com as tecnologias da informação e da comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2010. Cap. 03 (p. 66 - 93) [Resenha] Cap-03

Ivanderson Pereira da Silva





Na parte introdutória deste capítulo, os autores vão revelar que o seu objetivo principal neste capítulo é “analisar o impacto  das TIC na educação formal e escolar a partir de uma revisão de estudos sobre a incorporação destas tecnologias na educação e de seus efeitos sobre as práticas educacionais e os processos de ensino e aprendizagem” (p. 66). Vão afirmar que “a penetração das TIC nas escolas e nas salas de aula ainda é limitada. [...] O que ocorre é que se trata de um potencial que pode ou não vir a ser uma realidade, e pode tornar-se realidade maior ou menor medida, em função do contexto no qual as TIC serão, de fato, utilizadas. São portanto, os contextos de uso que acabam determinando seu maior ou menor impacto nas práticas educacionais e sua maior ou menor capacidade para transformar o ensino e melhorar a aprendizagem” (p. 66 e 67).

No tópico intitulado “O impacto das TIC na educação: discursos e expectativas”, os autores afirmam que,

No novo cenário social, econômico, político e cultural da SI – muito facilitado pelas TIC e outros desenvolvimentos tecnológicos que estão ocorrendo desde a segunda metade do século XX –, o conhecimento passou a ser a mercadoria mais valiosa de todas, e a educação e a formação são as vias para produzir e adquirir essa mercadoria. Neste cenário, a educação deixou de ser vista apenas como um instrumento para promover o desenvolvimento. A socialização e a enculturação das pessoas, um instrumento de construção da identidade nacional ou um meio para construir a cidadania. Neste cenário, a educação adquire uma nova dimensão: transforma-se no motor fundamental do desenvolvimento  econômico e social. Tradicionalmente, a educação tem sido considerada uma prioridade das políticas culturais, de bem estar social e de equidade. Junto com as TIC, na SI a educação e a formação passam a ser uma prioridade estratégica para as políticas de desenvolvimento, com tudo o que isso representa. Mas o que interessa sublinhar agora é que a centralidade crescente da educação e da formação na SI tem vindo acompanhada por um protagonismo igualmente crescente das TIC nos processos educacionais e formativos. O objetivo de construir uma economia baseada no conhecimento requer que a aprendizagem seja colocada em destaque, tanto no plano individual quanto no social; neste marco, as TIC, e mais especificamente as novas tecnologias multimídia e a Internet, apresentam-se como instrumentos poderosos para promover a aprendizagem, tanto de um ponto de vista quantitativo como qualitativo. Por outro lado, estas tecnologias tornam possível, por meio da supressão das barreiras espaciais e temporais, que mais pessoas tenham acesso à formação e à educação. Por outro, graças às tecnologias multimídia e à Internet, novos recursos e possibilidades educacionais estão disponíveis. Além disso, a utilização combionada das tecnologias multimídia e da Internet torna possível aprender em praticamente qualquer cenário. [...] As instituições de educação formal, estão sofrendo transformações progressivas como consequência do impacto destes fatores e fenômenos típicos da SI, associados, pelo menos até certo ponto, com as TIC; outras instituições, que não são estritamente educacionais  - como a família, o local de trabalho, museus e centros culturais –, têm sua potencialidade como cenários de educação e formação consideravelmente aumentada; e outros espaços até agora inexistentes –, como por exemplo, os espaços virtuais  de comunicação, on-line ou em rede, que as TIC permitem configurar – emergem como cenários particularmente idôneos para a formação e o aprendizado. Em suma, as TIC estão transformando os cenários educacionais tradicionais e, ao mesmo tempo, promovendo o surgimento de outros novos. (p. 67 e 68)



Ao fazer esta provocação, os autores apontam um deslocamento de olhar investigativo: “por um lado, o interesse se desloca da análise das potencialidades das TIC no ensino e na aprendizagem para o estudo empírico dos usos efetivos que professores e alunos fazem dessas tecnologias no transcurso das atividades de ensino e aprendizagem. Por outro lado, as possíveis melhoras de aprendizagem dos alunos são vinculadas à sua participação e envolvimento nessas atividades, nas quais a utilização das TIC é um aspecto importante, mas apenas um entre os muitos aspectos relevantes envolvidos” (p. 70).  Neste sentido, o problema real não são as potencialidades das TIC, mas sim o que se faz efetivamente com elas.

O tópico intitulado “Sobre os usos das TIC nas escolas e nas salas de aula”, está organizado em dois subtópicos. Na parte introdutória, os aurores vão destacar que há “enormes diferenças entre os países no que se refere à incorporação das TIC na educação e à conexão das escolas à internet. Assim, enquanto em alguns países a maioria, ou mesmo a totalidade, das escolas contam com equipamentos de alto nível e dispõem de conexão à internet de banda larga, em outros continuam existindo carências enormes em ambos os aspectos. Tais diferentes, por outro lado, não existem apenas entre países ou entre regiões como frequentemente são detectadas também dentro de uma única região ou até do mesmo país” (p. 70 e 71).

Numa análise dos estudos nacionais (espanhois) e internacionais acerca das TIC na sala de aula, os autores concluem que: “todos os estudos [...] coincidem em destacar dois fatos que; com maior ou menor intensidade, conforme o caso, aparecem com frequência. O primeiro fato guarda relação com o uso limitado que professores e alunos normalmente fazem das TIC. E o segundo, com a limitada capacidade que parecem ter essas tecnologias para impulsionar e promover processos de inovação e melhora das práticas educacionais.” (p. 71). Ambas as conclusões, são questionadas pelos autores, segundo a citação anterior.

O primeiro subtópico deste tópico, intitulado “Das expectativas às realidades: os resultados da pesquisa” enfoca a análise de estudos internacionais sobre o impacto das TIC nos processos de ensinar e aprender dentro das escolas e conclui o seguinte: “os resultados obtidos indicam eu enquanto as TIC, em geral,  e os computadores e a internet, em particular, são utilizados frequentemente por uns e por outro sno lar, eles praticamente não são usados nas escolas. Ou ainda pior, os usos que são dados às TIC na sala de aula são, com frequência, “periféricos” aos processos de ensino e aprendizagem (por exemplo para digitar textos)” (p. 72).

Após fazerem esta constatação, os autores vão analisar um relatório de pesquisa sobre o uso das TIC nas escolas espanholas e vão concluir o seguinte:

·         Investir mais em Tecnologia na Escola: “É necessário melhorar muito no que se refere ao número de salas de aula com computadores com conexão à internet e ao número de computadores nas salas de aula ordinárias” (p. 73).

·         Melhorar a qualidade das práticas escolares com uso das TIC: “as atividades, de ensino e aprendizagem desenvolvidas na maioria das aulas ordinárias do ensino fundamental e do ensino médio na Espanha não incorporam as TIC” [...] “os usos mais frequentes [...] estão relacionados principalmente com a busca e processamento da informação” (p. 73).

·         Aproximar o discurso das práticas: “há uma defasagem considerável entre a atitude positiva e elevada valorização que o professorado expressa e tem das TIC e o uso limitado que dá a elas em sua prática docente” (p. 73).

·         Minimizar a distância entre o que sabem os professores e o que sabem os alunos sobre TIC: “há uma defasagem clara entre o nível de comodidade que sentem os alunos e o que sente o professorado frente às TIC” (p. 73).

·         Valorizar o saber do aluno sobre as TIC: “chama atenção a defasagem existente entre os conhecimentos e as capacidades relacionadas com as TIC que os alunos dizem ter e o escasso aproveitamento que é feito destas nas escolas e nas salas de aula” (p. 74).

No subtópico intitulado “Chaves para a compreensão da defasagem entre expectativas e realidades”, os autores vão defender que: “os professores tendem a dar às TIC usos que são coerentes com seus pensamentos pedagógicos e com sua visão dos processos de ensino e aprendizagem. Assim, com uma visão mais transmissiva ou tradicional do ensino e da aprendizagem, tendem a utilizar as TIC para reforçar suas estratégias de apresentações e transmissão de conteúdos, enquanto aqueles que têm uma visão mais ativa ou “construtivista” tendem a utilizá-las para promover as atividades de exploração ou indagação dos alunos, o trabalho autônomo e o trabalho colaborativo” (p. 75).

Vão neste subtópico reforçar a tese que vem sido defendida desde a apresentação do livro na página 11:

A incorporação das TIC na educação não transforma nem melhora automaticamente os processos educacionais, mas, em compensação, realmente modifica substancialmente o contexto no qual estes processos ocorrem e as relações entre seus atores e entre esses atores e as tarefas e conteúdos de aprendizagem, abrindo, assim, o caminho para uma eventual transformação profunda desses processos, que ocorrerá, ou não, e que representará, ou não, uma melhora efetiva, sempre em função dos usos concretos que se dê à tecnologia. (p. 11)



A simples incorporação ou uso em si das TIC não geram, inexoravelmente, processos de inovação e melhoria do ensino e da aprendizagem; na verdade, são determinados usos específicos  das TIC que parecem ter a capacidade de desencadear esses processos. (p. 75)



O tópico intitulado “O potencial das TIC para o ensino e para a aprendizagem” está organizado em três subtópicos. No primeiro subtópico intitulado “As TIC como instrumentos para pensar e interpensar” os autores vão defender que “todas as TIC, digitais ou não, somente passam a ser instrumentos psicológicos, no sentido vygotyskyano, quando seu potencial semiótico é utilizado para planejar e regular a atividade e os processos psicológicos próprios e alheios” (p. 76). No glossário deste capítulo, os autores vão definir instrumentos psicológico como sendo:

Um conceito que tem origem nos trabalhos de L.S. Vygotsky sobre a importância da mediação semiótica do desenvolvimento dos processos psicológicos superiores e na aprendizagem humana. De acordo com a definição proporcionada por Kozuloin (2000, p. 15), “os instrumentos psicológicos são os recursos simbólicos – signos, símbolos, textos, fórmulas, meios gráfico-simbólicos – que ajudam o indivíduo a dominar suas próprias funções psicológicas ‘naturais’ de percepção, memória, atenção, etc. Os instrumentos psicológicos atuam como uma ponte entre os atos individuais de cognição e os requisitos simbólicos socioculturais desses atos”. A linguagem é, para Vygotsky, o instrumento psicológico por excelência. As TIC, devido às suas características semióticas, podem ser vistas como instrumentos psicológicos no sentido vygotskyano, ou seja, como recursos que as pessoas podem utilizar para “dominar” seus processos psicológicos (p. 92).



E novamente, os autores vão eleger as práticas como as TIC como sendo as responsáveis pela efetiva transformação. “a capacidade mediadora das TIC como instrumentos psicológicos é uma potencialidade que, como tal, torna-se ou não efetiva – e pode tornar-se efetiva em maior ou menor medida – nas práticas educacionais que transcorrem nas salas de aula em função dos usos que os participantes fazem delas” (p. 76 e 77).

Os autores no subtópico intitulado “Ferramentas tecnológicas e práticas educacionais: do projeto ao uso” vão destacar três níveis diferentes de indagação e análise para responder por que os professores dão determinado uso, e não outro, para as TIC.

·         Projeto tecnológico: “em primeiro lugar, os usos que os participantes efetivamente façam das TIC dependerão, em grande medida, da natureza e das características do equipamento e dos recursos tecnológicos que forem postos a sua disposição” (p. 77)

·         Projeto pedagógico ou instrucional: refere-se ao que se propõem as ferramentas tecnológicas. “o projeto técnico-pedagógico é apenas um referencial para o desenvolvimento do processo formativo, e como tal está inevitavelmente sujeito às interpretações que os participantes fazem dele” (p. 78).

·         Análise das formas de organização da atividade conjunta desenvolvida pelos participantes e dos usos efetivos das TIC: “a organização da atividade conjunta é, em si, o resultado de um processo de negociação e de construção por parte dos participantes, de maneira que tanto as formas de organização que vão se sucedendo ao longo do processo formativo quanto os usos dados às ferramentas tecnológicas não podem ser entendidos como uma simples transposição ou um mero desenvolvimento do projeto técnico-pedagógico previamente estabelecido. [...] é justamente nesta recriação e redefinição que o potencial das ferramentas tecnológicas como instrumentos psicológicos torna-se efetivo ou não, mediante sua contribuição para o estabelecimento de determinadas formas de organização da atividade conjunta e incidindo em maior ou menor medida, por meio destas, nos processos intra e intermentais envolvidos no ensino e na aprendizagem” (p. 78).



Em síntese, “os usos efetivos que professores e alunos fazem das TIC dependem tanto do projeto técnico-pedagógico das atividades de ensino e aprendizagem em que estão envolvidos quanto da recriação e redefinição  que eles fazem dos procedimentos e normas de uso das ferramentas incluídas nesse projeto” (p. 78)

O subtópico intitulado “Rumo a uma tipologização dos usos das TIC na educação formal” os autores vão apresentar tipologizações das TIC já disponíveis e avão afirmar que essas até o momento, não tem levado em conta o uso dessas, mas sim as suas características ou técnicas ou potencialidades pedagógicas. Vão propor uma tipologização de usos que contempla cinco categorias de usos e que é representada pelo “triangulo interativo”.

·         As TIC como instrumentos mediadores das relações entre alunos e conteúdos (e tarefas) de aprendizagem;

·         As TIC como instrumentos mediadores das relações entre professores e conteúdos (e tarefas) de ensino e aprendizagem;

·         As TIC como instrumentos mediadores das relações entre professores e alunos ou dos alunos entre si;

·         As TIC como instrumentos mediadores da atividade conjunta desenvolvida por professores e alunos durante a realização das tarefas ou atividades de ensino e aprendizagem;

·         As TIC como instrumentos configuradores de ambientes ou espaços de trabalho e de aprendizagem.



A respeito desta tipologização os autores vão ponderar que a mesma ainda não está finalizada e que “as fronteiras entre algumas categorias são mais difusas do que se pode parecer à simples vista e resulta as vezes difícil estabelecer com precisão a qual categoria pertence um uso concreto de uma ferramenta de TIC (p. 85)[...] frequentemente essas relações não são estáveis, mas evoluem e se modificam em um ou outro sentido conforme o professor e os estudantes desenvolvem as atividades  de ensino e aprendizagem; portanto, é lógico supor que os usos das TIC, em seu caráter de instrumentos que medeiam essas relações, podem experimentar, também, uma evolução” (p. 86).

Advertem ainda que “nenhuma das cinco categorias de usos pode ser considerada a priori e em termos absolutos mais inovadora, mais transformadora ou “melhor” do que as outras” (p. 86) e que “o potencial das TIC para influenciar os processos inter e intrapsicológicos envolvidos nos processos de ensino e aprendizagem será tanto mais elevado quanto maior for sua incidência na maneira como professores e alunos organizam a atividade conjunta em torno dos conteúdos e tarefas de aprendizagem” (p. 86).

Para finalizar esse subtópico, os autores vão apontar lacunas (a partir do levantamento teórico-bibliográfico realizado) nos estudos sobre os usos das TIC e com isso apresentar campos férteis para a pesquisa na área:

A maioria dos usos identificados e descritos correspondem às duas primeiras categorias da nossa classificação (usos das TIC como instrumentos  mediadores das relações entre os alunos – e entre os professores – e os conteúdos e tarefas de aprendizagem). Os usos que poderiam corresponder às outras três categorias são pouco frequentes e em alguns estudos nem sequer foi possível documenta-los. A isso é preciso acrescentar, por outro lado, a coincidência da maioria dos estudos em destacar o escasso efeito transformador das práticas educacionais que a incorporação das TIC provocou até agora. Estes fatos reforçam, segundo nosso entendimento, a hipótese que vincula o potencial transformador das TIC com seu uso enquanto instrumentos mediadores das relações entre os três elementos do triângulo interativo e, mais concretamente, como instrumentos mediadores da atividade conjunta que professores e alunos desenvolvem em torno dos conteúdos e tarefas de aprendizagem. (p. 86 e 87).



O último tópico do capítulo enfoca “A incorporação das TIC na educação: desafios”. Os autores vão nesta último tópico os autores vão defender a incorporação das “TIC na educação escolar coma  finalidade de tornar mais eficientes e produtivos os processos de ensino e aprendizagem, aproveitando os recursos e possibilidades que tais tecnologias oferecem” (p. 87); que “as TIC em geral, e a internet em particular, ainda são pouco utilizadas – pouquíssimo, na maioria das salas de aula – e que, quando utilizadas, tanto pelos professores quanto pelos alunos, com frequência é para fazer o que já se fazia antes sem elas” (p. 87).

Acreditam que a solução deste problema pode se dar “conforme forem cobertas as carências de equipamentos e infraestrutura – que, conforme já assinalamos, continuam sendo muito significantes em muitos países – e aumentem os recursos de formação e apoio, tanto o professorado quanto os alunos passarão a incorporar progressivamente as TIC nas atividades de ensino e aprendizagem na sala de aula” (p. 88).

Vão defender que “o que se persegue com a sua incorporação na educação escolar é aproveitar o potencial dessas tecnologias para promover novas formas de aprender e ensinar. Não se trata, assim, de utilizar as TIC para fazer a mesma coisa, porém melhor, com maior rapidez e comodidade ou mesmo com mais eficácia, mas para fazer coisas diferentes, para pôr em marcha processos de aprendizagem e de ensino que não seriam possíveis se as TIC fossem ausentes” (p. 88). [...] “Enquanto não se proceder a essa revisão profunda do currículo escolar, vamos talvez continuar avançando na incorporação das TIC na educação, no sentido de melhorar o conhecimento e domínio que os alunos possuem dessas tecnologias, e até a utilização eficaz destas  por parte do professorado e dos alunos para desenvolver sua atividade como docentes e aprendizes respectivamente; muito mais difícil, contudo, será avançar no aproveitamento efetivo das novas possibilidades de ensino e aprendizagem que nos oferecem, potencialmente, as TIC”. (p. 89)

Ao final do capítulo, os autores apresentam as referências, um glossário contendoa definição do seguintes conceitos: ferramentas da mente (mindtools); instrumentos psicológicos; e projeto técnico-pedagógico ou técnico-instrumental.

LALUEZA, José Luis; SILVA CAMPS, Isabel Crespo. As tecnologias da informação e da LALUEZA, José Luis; SILVA CAMPS, Isabel Crespo. As tecnologias da informação e da comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2010. (p. 47 - 65) [Resenha] Cap- 02

Ivanderson Pereira da Silva





Este capítulo está organizado em quatro tópicos e enfoca o impacto das TIC no desenvolvimento humano com foco cultural.  O primeiro enfoca o acoplamento entre o meio e o sujeito e a forma como esta relação determina a constituição do sujeito. Mais especificamente como o homem produz a tecnologia e esta por sua vez, produz ao homem. “Visto a partir de uma perspectiva construtivista que entende o desenvolvimento como a transformação por meio do processo de troca entre organismo e ambiente físico e social, as tecnologias desempenham um papel essencial na definição dos processos evolutivos” (p. 47). “Toda atividade humana é mediada pelo uso de ferramentas de maneira que, [...] o desenvolvimento é, em grande medida, a apropriação das ferramentas (materiais e simbólicas) do nicho cultural em que a criança opera” (p. 47).

O projeto evolutivo de uma criança que pertença a uma sociedade de caçadores-coletores é radicalmente diferente daquele de outra nascida em uma sociedade de agricultores-pecuaristas ou sociedade industrial. Caçar, ou seja, utilizar os instrumentos de caça, requer habilidades motrizes, perceptivas e cognitivas muito diferentes daquelas que são necessárias para trabalhar a terra ou para dominar uma variedade de instrumentos próprios de uma sociedade complexa como a industrial. Além disso, as tecnologias próprias de cada momento histórico contribuem para promover metas cognitivas, relações sociais, práticas cotidianas e expectativas de comportamento  diferentes. As relações familiares, as formas legitimadas de poder, as relações de gênero e a forma de divisão do trabalho diferem à medida que estejam inseridas em contextos de atividades diferentes e sejam mediadas por ferramentas também diferentes. Não se trata, então, apenas das diferenças entre as habilidades necessárias para usar, por exemplo, o arco e as flechas e aquelas requeridas para utilizar o arado. As práticas sociais nas quais estão envolvidos os membros de uma sociedade de agricultores, tais como a acumulação de recursos, a conservação de excedentes, o comércio, a conservação de excedentes, o comércio, a construção de moradias, a divisão do trabalho, com o aparecimento de castas e de ofícios, a gestão de impostos, etc., supõem um conjunto de tecnologias inexistentes nas sociedades de caçadores, cujo uso transformaria radicalmente a vida dos seus indivíduos, assim como os ideais de homem e mulher que guiam a educação das suas crianças. (p. 48)



Percebe-se que os autores vão defender que o meio, influencia e modifica o sujeito. “Segundo a noção de atividade de Leontiev, no triângulo sujeito-ferramentas-objeto que caracteriza toda atividade, cada um dos vértices se transforma quando qualquer um dos vértices o faz. O indivíduo se constrói em função do objeto da sua atividade e dos artefatos que a medeiam” (p. 49). Extremamente interessante como os autores vão desenvolver a articulação entre os vértices desse triângulo. O sujeito produz as ferramentas e a interação com as mesmas determina novos comportamentos que redefinem o sujeito.

A escrita é, talvez, o exemplo mais claro desta espiral autopoiética. Leitura e escrita transformam as características cognitivas no que se refere ao tratamento da informação, tornando possível os avanços tecnológicos por meio da construção de novas ferramentas, como a imprensa e os meios de comunicação digital. Contudo, essas ferramentas expandiram, ao mesmo tempo, o uso da leitura e da escrita, universalizando-as e mediando o desenvolvimento das pessoas. Ou seja, a tecnologia não é apenas um conjunto de ferramentas, uma vez que deve ser considerada no marco das práticas institucionais em que está escrita e que, ao mesmo tempo, mantém. Prosseguindo com o exemplo da escrita, não devemos estar atentos apenas à forma como sua prática organiza o pensamento dos indivíduos, mas também à sua função social na mediação de múltiplas formas de comunicação e no estabelecimento de instituições relacionadas com a governança, a lei e a economia. E principalmente, devemos estar atentos ao contexto institucional em que tais habilidades são adquiridas: a escola. O impacto do uso da leitura e da escrita tem seu fundamento nas instituições que tornam necessário seu uso e na sua extensão para o conjunto da população; primeiro, com o surgimento de tecnologias como a imprensa e, depois, fundamentalmente, com a universalização da escola. (p. 49)



Autopoiese, no sentido exatamente do sujeito produzir a si mesmo.  O homem gera produtos que redefinem o homem, e que gera um novo homem. Esse novo homem gera novos produtos que gerarão um novo homem. O reflexo disso é que o homem modifica o meio e o meio modifica o homem.

O tópico seguinte, intitulado “O impacto dos computadores no desenvolvimento” está organizado em três subtópicos. Na parte introdutória, os autores vão apresentar exemplos de como a experiência com diferentes ferramentas, determina diferentes estratégias de resolução de situações problema. Vão defender que:

·         As TIC ampliam nossas habilidades do mesmo modo que os óculos, um microscópio ou um telescópio ampliam nossa visão;

·         Usar uma determinada ferramenta não só permite que melhoremos nossas habilidades quando a utilizamos como deixa um “rastro”, ou seja, uma vez que nos apropriamos de seu uso, nossas capacidades melhoram;

·         A ferramenta transformou nossa forma de entender a tarefa e, inclusive, gerou novas metas. (p. 50)

Trocando em miúdos,



uma tecnologia aparece em um contexto histórico como amplificadora das habilidades humanas (efeitos “com”). No caso das ferramentas que amplificam capacidades cognitivas, como a escrita, ocorre também um efeito de melhora dessas capacidades (efeitos “de”). Finalmente, mediante o uso da nova tecnologia , a longo prazo, há uma reorganização do próprio sistema cognitivo, da maneira pela qual se pensa nessa cultura. [...] A tecnologia contribui para orientar o desenvolvimento humano, pois opera na zona de desenvolvimento proximal de cada indivíduo por meio da internalização das habilidades cognitivas requeridas pelos sistemas de ferramentas correspondentes a cada momento histórico. [...] mesma tarefa é realizada mediante processos mentais diferentes, adquiridos por meio de práticas mediadas por ferramentas próprias de cada cultura e momento histórico (p. 50-51).



Justificado que as ferramentas produzidas culturalmente, são apropriadas por culturas diferentes de diferentes formas, determinando desta forma, novas práticas, novas habilidade cognitivas, novas estratégias e consequentemente, novas competências, os autores concluem esta fala introdutória afirmando que “mudanças nas ferramentas culturais supõem mudanças nas formas de inteligência valorizadas pela sociedade e, portanto, na orientação do desenvolvimento cognitivo, social e emocional dos indivíduos” (p. 51).

No subtópico intitulado “Videogames e novas metas do desenvolvimento cognitivo” os autores vão afirmar que

concretamente, os videogames exigem uma atenção visual dividida, ou processamento visual paralelo. Assim, em muitos videogames é necessário ao mesmo tempo, controlar o movimento de um personagem no centro do campo de visão e prestar atenção a objetos periféricos (“fontes de energia”, “pistas”, “bônus”, “armadilhas”, etc.) que podem estar em movimento ou aparecer e desaparecer em pontos da tela diferentes daquele em que transcorre a ação principal. Ao longo de duas décadas, foram realizadas algumas pesquisas que mostram a existência de melhores habilidades desse tipo em indivíduos que jogam videogame e, também, que tais habilidades se consolidam de maneira cumulativa. [...] Diversas pesquisas já mostraram que a prática de videogames melhora as habilidades que permitem resolver tarefas escolares relacionadas com a orientação espacial, como a rotação ou a integração de diversas imagens em uma única representação tridimensional. [...] A prática dos videogames está relacionada com determinadas formas de processamento cognitivo. Processamento de grandes volumes de informação em tempo reduzido, atenção em paralelo, deslocamento de funções do texto para a imagem, ruptura da linearidade no acesso a informação, busca de retroalimentação imediata para corrigir ou modificar a ação. Tudo isso supõe algumas mudanças no que se refere ao tipo de inteligência promovida e valorizada pela escola. [...] Uma vez que o uso do computador e dos consoles de jogos se alastra socialmente, ele se transforma em uma prática de socialização habitual na nossa sociedade, e a prática precoce das tecnologias propiciada pela generalização dos videogames no âmbito doméstico acaba produzindo um forte impacto nas habilidades cognitivas que definem a inteligência em uma cultura particular, assim como um desenvolvimento mais precoce dessas habilidades  (p. 52-54).



O subtópico intitulado “Processos evolutivos e a aprendizagem na apropriação das TIC” enfoca duas perspectivas de apropriação das TIC: a microgenética e a sociogenética. Para isto, vai tomar por base os videogames. E vai afirmar que “diferentemente de outros importantes artefatos culturais, como a escrita, não parece que as TIC são adquiridas majoritariamente na escola, mas basicamente no âmbito doméstico, e em geral o desenvolvimento das habilidades correspondentes está ligado mais nitidamente aos contextos informais, como o grupo de iguais” (p. 54). Os autores a partir deste momento, vão provocar uma reflexão que parece colocar a motivação com que os sujeitos se apropriam das TIC (e com especial destaque os videogames) em oposição a desmotivação para com a escola:

voltando aos videogames, em muitos estudos o seu potencial motivador é apresentado como elemento central. [...] vários aspectos que explicam esse potencial motivador: Caráter lúdico; Incorporação de níveis de dificuldade progressivos, que apresentam a tarefa como um desafio; Objetivos claramente colocados; Existência de incentivos intrínsecos à tarefa; Impacto sobre a autoestima conforme os objetivos propostos são alcançados; Individualização ou adaptabilidade ao ritmo pessoal imposto ao jogador; Identificação/projeção de fantasias com os conteúdos simbólicos dos videogames. [...] em resumo, os videogames parecem triunfar ali onde a escola frequentemente encontra dificuldades (p. 54)



Ou seja, os videogames triunfam na motivação, onde exatamente a escola fracassa. Discutindo sobre um determinado estudo, os autores defendem que: “os sujeitos do estudo – em sua maioria adolescentes – valorizavam os efeitos imediatos do uso das TIC: divertir-se, comunicar-se ou obter ajuda em suas tarefas escolares. Eles nunca colocaram o uso das TIC como acumulação de saber, e a apropriação de seu uso ocorre geralmente sem atender a manuais, mas diretamente “deixando rodar” o programa. Ocorre, então, uma interessante convergência entre aprender e usar, na qual novato procura o especialista para solucionar problemas concretos de uso” (p. 54). Neste discurso, os autores parecem sugerir que a escola deveria ensinar sem que os alunos percebessem que estão se apropriando do saber, mas sim, brincando.

Após fazer sua defesa das vantagens dos videogames e desvantagens da escola, os autores vão tentar apresentar os conceitos de apropriação por microgenia e sociogenia. Os autores não explicam bem o que é microgenético nem sociogenético. Mas ao buscar tais conceitos na internet, verifiquei que: sociogenético tem a ver com a origem da conservação da sociedade considerada em seus aspectos claramente humanos, como o estético, o espiritual e o intelectual. E numa passagem o autor diz que processo microgenético  são “as mudanças que ocorrem no momento de realizar uma tarefa ou construir um aprendizado” (p. 55).

No tópico intitulado “As TIC como ferramenta de socialização: violência, gênero e valores culturais”, os autores vão enfocar a “masculinização das tecnologias”. Vão defender que:

Uma das mais antigas abordagens sobre o impacto das TIC é centrada na percepção das ameaças que elas podem representar para o desenvolvimento social e emocional. [...] é evidente que uma parte importante dos videogames têm conteúdo violento, mas isso absolutamente não é uma novidade histórica no que diz respeito a oferta dirigida a crianças, adolescentes e jovens adultos, especialmente os de sexo masculino. Nas revistas em quadrinhos, filmes e espetáculos dirigidos  a esse setor da população, sempre estiveram presentes – e de maneira predominante – os conteúdos violentos. [...] a questão socialmente mais debatida consiste em se os videogames têm um impacto específico  na população que os usa, gerando, por exemplo, mais condutas violentas. Diversos estudos negam isso, como também negam outros efeitos comportamentais, o que não é de surpreender, uma vez que os videogames são narrativas que fazem parte da rede de significados da cultura e, por isso, não são autônomos na geração de valores. Pelo contrário, suas narrativas cobram significado em relação àquelas geradas pelo restante das práticas sociais das quais participam os indivíduos. (p. 55 e 56)



Após desmentir as afirmativas que apontam os videogames como agentes contribuintes da violência da sociedade, os autores vão apontar estes jogos como sendo machistas, por estarem direcionados ao público jovem de meninos, e também sexistas pelo fato de quando destinados a meninas, as colocarem em situações, de festa, compras ou cuidando do lar.  Para esses autores, “as tecnologias presentes em uma cultura, contribuem na definição daquilo que nessa cultura se considera inteligência [...] O uso das TIC apresenta-se, assim, em sintonia com os valores das culturas ocidentais modernas, fortemente individualistas, que orientam a educação mais para transformação do mundo físico do que para tratar do mundo social. [...] A relação entre tecnologia e práticas culturais é evidente, mas é a prática social, e não a ferramenta em si, o que define a atividade [...] Elas não são autônomas, uma vez que cobram sentido através do seu uso em contextos concretos de atividade” (p. 57 e 58).

O tópico intitulado “As TIC e os novos marcos de socialização” está organizado em dois subtópicos. Na parte introdutória deste tópico, os autores vão defender que “nas sociedades tradicionais, e mesmo nas cidades modernas da era industrial, as relações sociais estavam circunscritas basicamente ao espaço e ao tempo imediato. A maioria dessas relações eram pessoais e aconteciam no seio de pequenas comunidades: a família, a vizinhança, o povoado onde se residia. A socialização, a entrada em um âmbito cultural, a apropriação dos significados da própria cultura, ocorria a partir da relação entre esses sistemas. Em contraposição a isso, a proliferação atual das TIC está configurando novas estruturas sociais e formas de organização nas quais os limites espaço-temporais tradicionais são colocados em xeque. Gergen (2002) situa essas mudanças no núcleo do que passou a ser chamado pós-modernidade e que tem como resultado um novo tipo de identidade. Tanto nas sociedades tradicionais pré-modernas quanto na modernidade, o mundo e as relações que nele se estabeleciam eram mais estáveis e, portanto, mais previsíveis. Assim, a variabilidade nos processos de socialização em um contexto determinado era mínima. Mas as TIC permitiram aumentar continuamente a quantidade e variedade das relações que estabelecemos, a frequência potencial dos nossos contatos humanos, a intensidade expressada nessas relações e sua saturação. Portanto, criaram-se novas formas de relação que trouxeram consigo novos marcos de socialização. [...] As relações entre os sujeitos e objetos através de ferramentas não acontecem mediante ações solitárias, mas em um contexto de relações comunitárias, em que as mudanças nas normas ou nas formas de divisão do trabalho transformam radicalmente a atividade e, portanto, o sujeito” (p. 58 e 59). Justificando assim o estudo de comunidades virtuais.

No subtópico intitulado “Redefinição dos limites da comunidade e cibercultura” os autores vão enfocar a ampliação das comunidades físicas para o espaço virtual criando assim uma cibercultura. Defendem que:

Considerar a internet como um local onde é gerada uma cultura – o ciberespaço – tem sua primeira formulação teórica em Rheingold (1993), que destacou que as comunicações mediadas por computador (CMC) eram capazes de prover formas de interação muito ricas e de proporcionar o espaço idôneo para a formação de comunidades. Definiu a expressão “comunidade virtual” da seguinte maneira: “as comunidades virtuais são congregações sociais que emergem da internet quando suficientes pessoas se mantêm em uma discussão pública, durante tempo suficiente, com sentimento humano suficiente para estabelecer redes de relações pessoais no ciberespaço” (Rheingold, 1993, p. 5) [...] As comunidades virtuais devem ser entendidas como tais porque compartilham as mesmas características: geram sociabilidade e redes de relações humanas. O que as diferencia das comunidades físicas é que são comunidades pessoais, ou seja, compostas por pessoas com base em interesses individuais e afinidades pessoais. São, portanto, redes mais nitidamente utilitárias do que as comunidades físicas. Estudos posteriores (lipman, citado por Castells, 2002) destacam a maior sustentabilidade das comunidades  que estão mais ligadas a tarefas ou a perseguir interesses comuns conjuntos. Em qualquer caso, as comunidades contribuem para configurar parte de uma rede social. Diferentemente do que as antiutopias mais catastróficas prognosticavam o uso da internet não para estar associado ao isolamento. Pelo contrário, quanto mais rede social física se tem, mais se utiliza a internet; e quanto mais se utiliza a internet, mais se reforça a rede física que se possui (Welman, 2004). Conforme crianças e adolescentes vão tendo acesso ao uso da internet, suas possibilidades de participação em novos âmbitos comunitários e seu acesso a novas fontes de significado aumentam. Isso rompe os limites da comunidade física, ampliando o número de microssistemas e tornando mais complexa a relação entre estes. Aos desafios da relação entre família, a escola e o grupo de amigos – os microssistemas “clássicos” -, soma-se agora o das relações com um número ilimitado de sistemas virtuais, cada um deles gerador da sua própria microcultura. (p. 59 e 60)



No subtópico intitulado “Novas formas de narrativa e de comunicação”, os autores vão apresentar como as TIC redefiniram a linearidade da leitura e da escrita bem como a temporalidade das narrativas e a amplitudes dos escritos na internet. Vão novamente enfatizar que “o          que explica as transformações cognitivas não é a aquisição da ferramenta em si, mas o conjunto das práticas em que seu uso se introduz, ou seja, o marco institucional no qual é adquirida e utilizada. Da mesma maneira acreditamos, o impacto cognitivo das TIC reside nas práticas dentro das quais elas são utilizadas, no seu papel de mediação das atividades realizadas por meio dessas práticas” (p. 60)

Ao se posicionar de maneira afirmativa, os autores vão apresentar as novas formas de escrita e leitura.

navegar na internet envolve leitura e a utilização de aplicativos como correio eletrônico, fóruns, chats ou blogs supõe escrever. Mas é importante salientar que tanto a leitura quanto a escrita são praticadas na internet de maneira muito diferente da tradicional. A leitura não é necessariamente linear e é o próprio leitor que escolhe o “fio da meada” que seguirá, a partir de diferentes opções, de modo que uma parte considerável do esforço estará relacionado à seleção daquilo que será lido e do que será descartado. [...] Diferentemente da narrativa convencional, na qual os eventos podem se diferenciar segundo o momento em que ocorreram e aparecem uns após os outros, a internet se caracteriza, entre outras coisas, pelo aparecimento de múltiplos padrões complexos de temporalidade. [...] Por exemplo, apesar da apresentação da informação em um blog ser linear no sentido temporal, ou seja, cada um dos posts é apresentado em ordem cronológica, isso não significa que sua leitura esteja limitada pela temporalidade, uma vez que a hipertextualidade da rede nos permite romper essa estrutura, ir e voltar no tempo. (p. 60 e 61)



Por fim, os autores vão apresentar o impacto do que se escreve nas interfaces da internet.

Publicar de maneira instantânea, a partir de quase qualquer idade, um texto que pode chegar a ser lido por milhares de desconhecidos, e isso sem ter que passar por uma editora; manter uma conversa com alguém que não se viu nunca e que nem se está vendo no momento; trocar textos diariamente com pessoas que vivem em outro continente são coisas que dão uma nova dimensão à escrita. Em suma, estamos diante de novas ferramentas desenvolvidas a partir de uma velha ferramenta, a escrita. A apropriação dessas ferramentas por meio de determinadas  práticas sociais põe em jogo elementos que supõem o desenvolvimento de algumas habilidades diferentes das requeridas na leitura e na escrita clássicas, ao mesmo tempo que constituem, em si, novos marcos de socialização e vinculação às redes sociais. (p. 61)



Para concluir o capítulo, os autores vão trazer o tópico “Linhas emergentes para o estudo das TIC nos processos de desenvolvimento e socialização” que tem por objetivo apresentar três linhas de estudo sobre “os novos âmbitos de socialização ligados às TIC que, pelo menos neste momento, parecem ser importantes” (p. 62):

·         Possibilidade da virtualidade levada ao extremo: a exemplo disso, os autores destacam o Second Life. “encontramo-nos aqui com algo como uma nova recorporização, com formas de construção de identidades que utilizam não apenas a narrativa e o texto como também a imagem e representações icônicas nas quais o corpo se satura de conteúdos simbólicos” (p. 62) Neste tópico os autores apresentam a possibilidade dos sujeitos simularem situações do cotidiano, antes de experiênciá-las, tais como casamento, a paternidade etc.

·         As questões relacionadas a brecha digital: “Apesar do fato de existir um contingente cada vez maior de população integrado ao uso das TIC, a questão radica no contexto de atividade em que esse acesso existe”;

·         As possibilidades que as TIC abrem para formas de expressão e criação desde idades precoces.



Este parece ter sido o capítulo que mais lacunas deixou. Acredito que os autores deveriam ter explorado mais e melhor conceitos como microcognitivo, sociocognitivo, antiutopias, prognósticos, filogenético, ontogenético, e moratória psicossocial. Além dos conceitos que não ficam claros ao longo do estudo, os autores pecam no que concerne aos termos usados no glossário. Ao final do artigo, é disponibilizado um glossário contendo três conceitos: contexto de atividade, narrativas digitais e tecnogênese. O último termo, “tecnogênese” não aparece em nenhum momento do texto. Este, na minha concepção, foi o artigo do livro, que mais gerou dúvidas.

COLL, César; MONEREO, Carles. Educação e aprendizagem no século XXI: novas ferramentas,novos cenários, novas finalidades. COLL, Cesar; MONEREO, Carles. Psicologia da educação virtual: aprender e ensinar com as tecnologias da informação e da comunicação. Porto Alegre:Artmed, 2010. (p. 15 – 46) [Resenha] Cap.01

Ivanderson Pereira da Silva





O primeiro tópico intitulado “Tecnologia, sociedade e educação: uma encruzilhada de influências” está organizado em três subtópicos. O primeiro, intitulado “As forças da mudança”, os autores vão defender que  “o impacto das TIC na educação é, na verdade, um aspecto particular de um fenômeno muito mais amplo, relacionado com o papel dessas tecnologias na sociedade atual” (p. 15). Ou seja, trata-se da consequência do impacto das TIC na sociedade da informação (SI) que tem reflexos de ordem econômica, social, política e cultural. Defende ainda que “a internet não é apenas uma ferramenta de comunicação e de busca, processamento e transmissão de informações que oferece alguns serviços extraordinários; ela constitui, além disso, um novo e complexo espaço global para a ação social e, por extensão, para o aprendizado e para a ação educacional” (p. 16). Diante disto, e apoiado no trabalho de Shayo e colaboradores (2007) os autores vão identificar quatro grandes forças propulsoras da internet: “o desenvolvimento de economias globais, as políticas nacionais de apoio à internet, a crescente alfabetização digital da população e o melhoramento gradual das infraestruturas tecnológicas” (p. 16). Para se ter ideia da dimensão destas forças, os autores afirmam que “A facilidade para se comunicar e trocar informações, junto com a enorme redução de custos que isso traz consigo, vem ocasionando, por exemplo, que alguns países tenham passado diretamente de uma economia centrada na agricultura para outra baseada nas TIC” (p. 17).

No segundo subtópico intitulado “a evolução das TIC e das modalidades educacionais associadas”, os autores vão alertar inicialmente da não neutralidade das TIC.

Todas as TIC repousam sobre o mesmo princípio: a possibilidade de utilizar sistemas de signos – linguagem oral, linguagem escrita, imagens estáticas, imagens em movimento, símbolos matemáticos, notações musicais, etc. - para representar uma determinada informação e transmiti-la. Para além dessa base comum, contudo, as TIC diferem profundamente entre si quanto às suas  possibilidades e limitações para representar a informação, assim como no que se refere a outras características relacionadas à transmissão dessa informação (quantidade, velocidade, acessibilidade, distância, coordenadas espaciais e temporais, etc.), e essas diferenças têm, por sua vez, implicações do ponto de vista educacional. (p. 17).



Posteriormente, os autores vão traçar uma linha com três etapas que na concepção dos mesmos, são chave para compreender a evolução das TIC no tempo e seu impacto na Educação.

·         A primeira, dominada pela linguagem natural (fala e gestualidade), caracteriza-se pela necessidade de adaptação do homem primitivo a um meio adverso e hostil, no qual o trabalho coletivo era crucial e a possibilidades de se comunicar de maneira clara e eficiente se constituía em um requisito indispensável. A transmissão oral, como único sistema de comunicação, dependia de alguns requisitos essenciais: os falantes deviam coincidir no tempo e no espaço e precisavam estar fisicamente presentes; as habilidades que precisavam possuir eram principalmente a observação, a memória e a capacidade de repetição. Tais habilidades estão na origem de algumas modalidades educacionais e de alguns métodos de ensino e aprendizagem – a imitação, a declamação e a transmissão e reprodução de informação – muito úteis para fixar e conservar conhecimentos imprescindíveis não apenas para reproduzir  manter a separação entre os diferentes estamentos sociais que compõem uma sociedade altamente hierarquizada.

·         A segunda etapa represneta a clara hegemonia do ser humano sobre o restante das espécies ; não mais se trata apenas de sobreviver, mas de adaptar a natureza às necessidades humanas por meio do desenvolvimento de técnicas alimentares, de construção, de vestimenta, etc. Privilegiando, por exemplo, certas espécies animais e vegetais sobre outras por meio da agricultura e do pastoreio, e influindo desse modo, na seleção natural. Mais uma vez, a necessidade de registrar certos dados, como uma memória externa, e de transmitir e compartilhar com outros as informações, experiências, conselhos, etc., está na origem do nascimento da escrita, que, embora não exista a presença física dos interlocutores, requer certa proximidade, dado que primeiro os mensageiros e depois o correio postal não podiam cobrir distâncias muito grandes. Tanto a presença tiopográfica quanto o correio revolucionam a sociedade do momento e estão na base da progressiva industrialização da economia, da migração urbana e da formação de uma sociedade de massas. Na educação, essas tecnologias de comunicação encontram seus referenciais em um ensino centrado em textos e no nascimento dos livros didáticos e do ensino a distância, por correspondência. A partir desse momento, e até a época atual, a formação de uma mente alfabetizada, letrada, capaz nãoa penas de decodificar foneticamente os grafemas como também de compreender os conteúdos de maneira significativa para utilizá-los, tem sido, provavelmente, o principal objetivo da educação formal. Com a  chegada dos sistemas de comunicação analógica, primeiro o telégrafo e, posteriormente, o telefone, o rádio e a televisão, as barreiras espaciais foram rompidas definitivamente e a troca de informações em nível planetário passou a ser uma realidade. Os novos meios audiovisuais entraram nos centros educacionais, embora ainda no complemento da documentação escrita. Fala-se hoje da necessidade de promover uma alfabetização gráfica e visual, embora as tentativas sejam tímidas e seu impacto, ainda limitado. Isso ocorre, em grande medida, devido à fulgurante entrada em cena da linguagem digital e à possibilidade de as diferentes tecnologias existentes convergirem em um único sistema de codificação que, além disso, utiliza suportes mais confiáveis, mais fáceis  de transportar, mais econômicos e com maior capacidade de armazenamento. Fruto da nova tecnologia foram os primeiros computadores digitais, no fim da década de 1940, que encontrariam na corrente comportamentalista e suas máquinas de ensino analógicas um terreno fértil para o desenvolvimento da educação assistida por computador que, apesar das críticas recebidas , continua com boa saúde e presente em muitas aplicações edumáticas (educação + informática)atuais. Graças à interligação entre diferentes computadores digitais  e à internet chegamos, assim, sitrictu sentu, à Sociedade da Informação, que poderíamos definir como um novo estágio de desenvolvimento das sociedades humanas, caracterizado, do ponto de vista das TIC pela capacidade de seus membros para obter e compartiljar qualquer quantidade de informação de maneira praticamente instantânea, a partir de qualquer lugar e na forma preferida, e com um custo muito baixo. Neste momento, por outro lado, já estamos iniciando uma nova subetapa, caracterizada pelo desenvolvimento das redes sem fio e pela internet móvel, os quais podem tornar possível a velha utopia da conectividade total. (p. 18-20)



Os autores afirmam que são três etapas, mas só delimitam bem duas. A segunda e a terceira etapas parecem não ter uma delimitação muito bem traçada e se confundem. Após traçar essas etapas, os autores vão apontar um outro viés de evolução da internet, a partir de metáforas:

  • A metáfora da internet enquanto estrada (highway)
  • A internet como ciberespaço (cyberspace)
  • a utilização do adjetivo “virtual”para “fenômenos que ocorrem na rede, dado que, em algum sentido, eles emulam a outros semelhantes que ocorrem no mundo real: comunicação virtual, ensino virtual, aprendizagem virtual, trabalho virtual, comunidade virtual, etc.
  • Posteriormente, foram aparecendo novas metáforas que se inscreveram nesta última: uma nova polis ou infopolis, uma nova sociedade em rede , um novo território, um novo espaço pela qual viajar, ou telépolis, etc. (p. 21)



No subtópico intitulado “o contexto da mudança: algumas características da Sociedade da Informação que são relevantes para a educação” os autores vão “assinalar e comentar brevemente alguns fenômenos, tendências ou características que, de acordo com boa parte das análises feitas até agora, são próprios  da SI, ou adquirem especial relevância nesse marco, e que formam, no nosso critério, o pano de fundo da educação neste novo cenário” (p. 23)

  • A complexidade, a interdependência e a imprevisibilidade que presidem as atividades e as relações dos indivíduos, dos grupos, das instituições e dos países são, junto com a globalização ou mundialização da economia, características frequentemente atribuídas à SI;
  • Informação, excesso de informação e ruído. No entanto ponderam que “a abundância de informação e a facilidade de acesso a ela não garante, contudo, que os indivíduos estejam mais e melhor informados” (p. 22). Os autores vão afirmar que a possibilidade de acesso às informaçõe sé um grande avanço, mas sem uma busca eficaz, sem explorá-las bem, a simples possibilidade de acesso não garante nada;
  • A rapidez dos processos e suas consequências;
  • A escassez de espaços e de tempo para a abstração e a reflexão. Em decorrência da rapidez dos processos, carece-se de tempo para aprofundar as reflexões.
  • A preeminência da cultura da imagem e do espetáculo que se de um lado representa um ganho pelas múltiplas possibilidades de comunicar, por outro revela uma deposição da escrita e da leitura;
  • A transformação das coordenadas espaciais e temporais da comunicação. É possível comunicar síncrona ou assincronamente, seja com pessoas perto ou longe. Mas cria-se ai um paradoxo para com “o tempo pessoal, ou tempo vivido, dos interlocutores e o tempo durante o qual se tem acesso a informação comunicada” (p. 24)
  • A homogeneização cultural. Trata-se da globalização da cultura através da comunicação e da troca  global.
  • O surgimento de novas classes sociais: os “inforicos” e os “infopobres”.



O tópico intitulado “A influência da internet: novas ferramentas, cenários e finalidades educacionais”, está organizado em seis subtópicos. Na parte introdutória do tópico, os autores vão apresentar três abordagens sobre o estudo da interação entre humanos e computadores:

  • Estudo do impacto do uso das TIC sobre os processos cognitivos do aprendiz-usuário (abordagem cognitiva) – foco nas interfaces, estudos experimentais sobre eficácia da interação computador – ser humano, modelos de usuários, critérios de usabilidade.
  • Estudo das variáveis relativas ao contexto educacional no qual acontece a aprendizagem (abordagem sociocognitiva) – de produtos a processos em pesquisa e design, de indivíduos a grupos, do laboratório ao local de trabalho, dos novatos aos especialistas, da análise ao design, do design centrado no usuário ao envolvimento do próprio usuário no design;
  • Estudo de contextos de atividade social, além dos especificamente orientados à educação (teoria da atividade) – para além do ambiente laboral, aprendizagem, jogo, lazer, para além do mundo adulto: as crianças e os jovens como autores e designers, para além da realidade virtual: computadores ubíquos, para além das ferramentas passivas: tecnologias persuasivas, para além da interação computador-ser humano: interação com Web adaptativa;



No subtópico intitulado “Novas ferramentas”, vão apontar três conceitos como sendo pilares das novas ferramentas: adaptabilidade, mobilidade e cooperação. “Em um mundo em que as distâncias são cada vez mais reduzidas, as fronteiras desaparecem e os grandes problemas são compartilhados, cresce a mobilidade das pessoas, aumenta a heterogeneidade das comunidades e torna-se patente a necessidade de trabalhar conjuntamente para resolver problemas comuns. A educação é obrigada a enfrentar essa situação e fala-se em escolas inclusivas (que tentam satisfazer a diversidade de necessidades educacionais de seus alunos), de educação não formal e informal (para aproveitar as oportunidades que a sociedade atual oferece para a educação e formação das pessoas e de aprendizado colaborativo e cooperativo (com a finalidade de tirar proveito dos conhecimentos e habilidades dos diversos membros de um grupo para satisfazer objetivos comuns” (p. 26).

No subtópico intitulado “Da acessibilidade e usabilidade à adaptabilidade” os autores vão afirmar que “o desafio agora é que os programas sejam capazes de se transformar em um alter ego para o aluno – ou para uma equipe de trabalho –, auxiliando-o de modo personalizado em suas tarefas graças à possibilidade de “aprender” com suas ações, omissões e decisões; estamos falando dos chamados “agentes artificiais” (p. 26). Os autores defendem ainda a autoria na mão dos próprios usuários. “Esta corrente, que coloca o usuário na posição de produtor e difusor de conteúdos, é conhecida com o nome de Web 2.0, em contraposição à perspectiva anterior de Web 1.0, que conferia ao usuário um papel de mero consumidor relativamente passivo” (p. 28).

No subtópico intitulado “Do e-learning ao m-learning”, os autores vão afirmar que “a progressiva miniaturização das tecnologias, junto com o desenvolvimento de plataformas móveis e da conexão sem fio, permitirão que os alunos possam continuar avançando em sua formação tendo acesso, a qualquer momento, por meio de seu celular, de agendas eletrônicas, computadores de bolso ou de outros dispositivos, a documentos, portfólios, fóruns, chats, questionários, webquests, weblogs, listas de discussão, etc. O m-learning ou ‘escola nômade’, segundo o termo cunhado por P. Steger, abre imensas possibilidades para se empreender trabalhos de campo, trocar reflexões, analisar conjuntamente atuações profissionais que estejam ocorrendo neste mesmo instante ou para integrar em um trabalho de equipe pessoas geograficamente afastadas entre si” (p. 28).

No subtópico intitulado “Da competição individual à cooperação” os autores vão defender que “a maioria das atividades humanas socialmente relevantes incluem um trabalho em grupo. Assim, ser competente, em sua dupla acepção de que uma tarefa ou responsabilidade compete a alguém e de que alguém é competente para realizar uma tarefa ou assumir uma responsabilidade, dificilmente pode ser considerado como um atributo exclusivamente individual, independente da competência de outros que estejam, direta ou indiretamente, envolvidos na situação e influindo e condicionando processos e produtos. Tradicionalmente, contudo, na educação formal e escolar, demonstrar a própria competência significa mostrar que se é competente em comparação ao resto dos aprendizes da mesma turma, da mesma escola ou do mesmo nível educacional, o que geralmente se traduz em entrar em competição com os demais, às vezes de maneira muito explícita e outras de maneira mais encoberta” (p. 28).

No tópico intitulado “Novos cenários”, os autores vão sinalizar a ubiquidade das tecnologias e em especial do computador. Ponderam que “não se trata de pôr a pessoa dentro do mundo fictício gerado pelo computador, mas de integrar o computador ao nosso mundo humano” (p. 31). Após considerar as implicações desta ubiquidade para o campo da educação os autores vão finalizar este tópico afirmando que “no médio prazo, parece inevitável que, diante dessa oferta de meios e recursos, o professorado abandone progressivamente o papel de transmissor de informação, substituindo-o pelos papéis de seletor e gestor dos recursos disponíveis, tutor e consultor no esclarecimento de dúvidas, orientador e guia na realização de projetos e mediador de debates e discussões” (p. 31).

No tópico intitulado “Novas finalidades” os autores vão inicialmente apresentar duas visões acerca da relação entre o que se conhece e a questão do emprego fixo. Após considerar, vai trazer a seguinte provocação: “quais são as competências que, neste novo cenário, deverão adquirir e desenvolver as pessoas para poder enfrentar, com garantias de êxito, os processos de mudança e transformação que estão ocorrendo?” Como resposta, os autores vão considerar três:

·         Ser capaz de atuar com autonomia;

·         Ser capaz de interagir em grupos socialmente heterogêneos;

·         Ser capaz de utilizar recursos e instrumentos de maneira interativa;

Cabe considerar no entanto que “nem tudo o que é tecnologicamente viável é pertinente em termos educacionais. E poderíamos acrescentar que nem tudo que é tecnologicamente viável e pertinente em termos educacionais é realizável em todos os contextos educacionais” (p. 33).

Consideram ainda que “está amplamente documentado, que escolas dotadas com os últimos avanços em ferramentas, infraestruturas e softwares de TIC frequentemente desenvolvem práticas educacionais cujo nível é muito baixo” [...] Assim, uma escola, uma equipe docente ou um professor com muitos anos de experiência, com sólidas concepções objetivistas e com práticas eminentemente transmissivas, provavelmente acabarão utilizando as TIC para complementar as aulas expositivas com leituras exercícios autoadministráveis na rede, mas dificilmente farão uso destas para que os estudantes participem em fóruns de discussão, trabalhem de maneira colaborativa ou procurem e contrastem informações diversas sobre um determinado tema. (p. 33). Para fechar o tópico os autores concluem: “A chave, portanto, não está em comparar o ensino baseado nas TIC com o ensino presencial, tentando estabelecer as vantagens e inconvenientes de um ou de outro. Em vez disso, melhor seria pesquisar como podemos utilizar as TIC para promover a aquisição e o desenvolvimento das competências que as pessoas precisam ter na era do conhecimento” (p. 34)

O último tópico, intitulado “Linhas emergentes e seus desafios” está organizado em três subtópicos que enfocarão ferramentas, cenários e finalidades prospectivas acerca de “estudos das mudanças provocadas pelas situações educacionais baseadas total ou parcialmente no uso das TIC” (p. 34). No subtópico primeiro intitulado “Ferramentas previsíveis”: da Web 1.0 a Web 3.0”, os autores vão traçar um panorama geral das características da Web 1.0 que consiste na “forma de perceber a internet como um imenso repositório de conteúdos ao qual os usuários podem acessar para procurar e baixar arquivos, corresponde, por assim dizer, à infância da rede” (p. 35). Já “a expressão Web 2.0 começou a ser utilizada a partir de 2001 [...]. A rede não é mais apenas um espaço ao qual ir para procurar e baixar informação e todo tipo de arquivos. Além disso, começa a incorporar e coordenar informação proveniente das mais diversas fontes, como peças de um enorme quebra-cabeças, relacionando dados e pessoas e facilitando uma aprendizagem mais significativa por parte do usuário. O mash-up, a mistura de recursos e conteúdos com a finalidade de construir ambientes mais ajustados às necessidades e desejos de um usuário ou de um grupo de usuários, passa a ser uma estratégia habitual de uso da internet. O software “se abre” (open software) e se liberta (free software) e os usuários passam a ser os verdadeiros protagonistas de seu próprio crescimento e sofisticação. [...] A anexação de conteúdo alheio denomina-se sindicação de conteúdos. Junto com essa potencialidade, existe outro mecanismo tão simples quanto poderoso, a folksonomia, termo utilizado para referir-se à organização colaborativa da informação em categorias a partir de uma série de etiquetas ou palavras-chave (tags) propostas pelos próprios usuários. [...] a Web 2.0 abre perspectivas de sumo interessa-se para o desenvolvimento de propostas pedagógicas e didáticas baseadas em dinâmicas de colaboração e cooperação” (p. 35-36). Por fim, os autores vão tecer suas considerações acerca da Web 3.0 ou “Web semântica”. “A Web semântica é uma visão da internet cuja proposta é de que a informação possa ser compreensível para – e não apenas localizável e acessível – os computadores, e isso com a finalidade de que eles possam realizar exatamente as mesmas tarefas que os humanos e não se limitem apenas, como realmente fazem agora, a armazenar, buscar, encontrar, processar, combinar e transferir informação. [...] a Web 3.0 se anuncia como uma base de dados global capaz de proporcionar recomendações personalizadas para os usuários diante das perguntas do tipo: a partir das minhas características psicológicas, físicas, culturais, orçamentárias, etc., o que eu deveria visitar nesta cidade? Em que curso de pós-graduação seria conveniente que eu me matriculasse no ano que vem? Que tipo de plano de aposentadoria eu deveria contratar? E outras dúvidas como essas” (p. 37).

O subtópico intitulado “Cenários educacionais prováveis: educação sem paredes” os autores vão falar sobre “novos cenários educacionais que se abrem aos nossos olhos e que questionam o ponto em que exatamente começa e termina a ação de escolas e professores. [...] tudo aponta na direção de que podem acabar surgindo três cenários paralelos e claramente interdependentes.

·         Em primeiro lugar, salas de aula e escolas cada vez mais “virtualizadas” ou seja,, com mais e melhores infraestruturas e equipamentos de TIC e com projetos pedagógicos e didáticos que tentarão aproveitar as potencialidades dessas tecnologias para o ensino e a aprendizagem.

·         Em segundo lugar, uma expansão das salas de aula e das escolas para outros espaços (bibliotecas, museus, centros culturais, etc.) nos quais será possível realizar, com o apoio das TIC, atividades e práticas com finalidades claramente educacionais – e provavelmente seja este o cenário que terá um maior desenvolvimento em um futuro próximo, como consequência do impacto das ferramentas e aplicativos próprios da Web 2.0 (weblogs, wikis, webquests, portfólios virtuais, folksonomias, etc.).

·         Em terceiro e último lugar, um cenário global e onipresente, uma espécie de “megaescola” na qual a ubiquidade das TIC e o desenvolvimento das tecnologias móveis e da sredes sem fio tornarão possível o aprendizado em praticamente qualquer lugar e situação. (p. 39)

O último subtópico deste capítulo, intitulado “Finalidades potenciais: entre o neoliberalismo e os movimentos sociais” vai trazer em suas linhas, os aspectos negativos das TIC e uma tentativa dos autores de apontar soluções, no entanto, tal tentativa fica nitidamente no plano das possibilidades. Para os autores,

  • As TIC e a internet não apenas têm uma importante parcela de responsabilidade nesta situação, como estão, com muita frequência, no centro do debate. Assim, por exemplo, em alguns círculos, são cultivadas posturas – as quais de nossa parte, não duvidamos em qualificar como maniqueístas e pouco realistas – que apresentam as escolas como instituições obsoletas que concentram todos os males, e as TIC e a internet como o remédio capaz de acabar com esses males e de refundar a instituição escolar. Com as TIC seria possível, finalmente, fazer com que o mundo real entrasse nas salas de aula e nas escolas e basear a aprendizagem dos alunos na indagação e na criatividade. Por trás dessas posturas, frequentemente se escondem, em nosso juízo, os interesses de grupos econômicos que aspiram a criar novos consumidores e a usurpar, de passagem, o poder que, embora enfraquecido, continuam tendo os sistemas de educação formal. Avivando sentimentos de incompetência e desesperança entre o professorado, os alunos e suas famílias, esses grupos esperam à espreita, que as escolas adotem “soluções extremas” alheias às finalidades da educação escolar, sem perguntar-se sobre o sentido e o alcance dessa opção. (p. 40)

  • Outra frente de debate   são as diversas “brechas digitais”, as distâncias que, surgem na Sociedade da Informação entre os “inforicos” e os “infopobres”, entre os países e os setores da população que têm acesso a um uso construtivo, enriquecedor e criativo das TIC e aqueles que não têm acesso a elas ou que as acessam apenas como consumidores. (p. 40)
  • Promovem uma comunicação de baixa qualidade, basicamente apoiada em textos escritos;
  • Restringem as comunicações emocionais, complexas e expressivas;
  • Potencializam as relações sociais superficiais e as vezes favorecema  irresponsabilidade e a falta de compromisso;
  • Permitem a agressão verbal, o insulto e os diversos “ismos” (racismo, sexismo, etc.);
  • Tendem a propagar e reforçar um saber mais instável, profano e mundano (infoxicação);
  • Descrédito da escola como instituição legitimada para conservar, criar e transmitir do conhecimento e à proposta de substituí-la por ambientes e professores virtuais por meio do uso generalizado das TIC;
  • Falta de compromisso pessoal e social que, segundo se afirma, as TIC e a internet, às vezes, têm como efeitos colaterais;
  • Riscos de que as TIC e a internet favoreçam o isolamento, potencializem o flaming e permitam esconder, manipular ou usurpar identidades;
  • Consequências negativas derivadas do excesso de informação e aos perigos da “infoxicação”;
  • “Brechas digitais” e o aparecimento de novas fraturas sociais em torno das TIC.



Por fim os atores vão trazer as referências, um glossário com a definição para os conceitos de Aprendizagem eletrônica móvel (m-learning), folksonomia (folksonomy), Globalização, Formação mista (Blended Learning ou B-Learning), Rede semântica, Tecnologia ubíqua (ubiquitous technology), e Virtual. Traz ainda sugestão de alguns textos para leituras complementares.