segunda-feira, 14 de novembro de 2011

COLL, César; ILLERA, José Luis Rodríguez. Alfabetização, novas alfabetizações e algabetização digital: as TIC no currículo escolar. COLL, César; MONEREO, Carles (orgs.). Psicologia da Educação Virtual: aprender e ensinar com as tecnologias da informação e da comunicação. Porto Alegre: Artmed, 2010. (p. 289 – 310) [Resenha]. Cap-14



Ivanderson Pereira da Silva


O texto está organizado em três tópicos. O primeiro intitulado: “Perspectivas sobre a alfabetização” é destinado “à colocação de algumas pontuações sobre o conceito de alfabetização e a comentar e analisar brevemente sua extensão e generalização para outros âmbitos de conhecimento e de prática.” (p. 290). Neste estudo, os autores compreendem por alfabetização o seguinte:
O conceito de alfabetização remete à língua escrita e à cultura letrada, baseada na capacidade de
,ler e escrever. De acordo com a UNESCO, uma pessoa alcança um nível de alfabetização funcional quando adquire o conhecimento e as habilidades de leitura e de escrita que a capacitam para envolver-se nas atividades mediadas pelos textos escritos habituais em sua cultura ou em seu grupo social. O conceito de alfabetização, tal como é entendido pela maioria dos autores de hoje, é inseparável do conceito de cultura letrada. Neste sentido, estar alfabetizado significa ser capaz de participar ativamente e de forma eficaz em uma série de práticas letradas. A alfabetização, contudo, é uma questão de grau: sempre é possível melhorar nossas competências de leitura e de escrita, assim como ampliar o leque de práticas letradas nas quais somos capazes de participar com eficácia. (p. 309-310)

No segundo tópico, intitulado “a alfabetização digital”, será abordado o conceito de alfabetização digital, sua relação com outros conceitos próximos, suas principais dimensões e será dada uma panorâmica geral das competências que geralmente lhe são associadas. Os autores compreendem por alfabetização digital o seguinte:
Em um sentido estrito, a alfabetização digital remete à capacidade de compreender, produzir e difundir documentos multimídia. Essa definição, contudo, comporta o risco de ocultar ou velar outros componentes ou dimensões importantes da alfabetização digital, entre os quais cabe destacar: a capacidade para manejar os textos escritos (alfabetização letrada) e os elementos audiovisuais (alfabetização audiovisual) normalmente presentes nos documentos multimídia; o conhecimento e o domínio funcional e eficiente das tecnologias digitais (alfabetização em TIC); e as capacidades para procurar e acessar a informação; gerenciá-la e armazená-la, processá-la, avaliá-la, produzi-la e comunicá-la, utilizando para isso as possibilidades que oferecem as tecnologias digitais – alfabetização no manejo da informação. (p. 310)
No terceiro e último tópico, intitulado “Alfabetização, cultura digital e currículo”, serão tecidos “comentários dirigidos a situar a alfabetização digital no marco mais amplo dos desafios que se apresentam para a educação escolar na sociedade da informação” (p. 290). Este tópico traz uma interlocução do conceito de alfabetização digital com o currículo escolar evidenciando o real problema que se coloca frente a uma cultura digital. Por cultura digital, os autores defendem que é:
Expressão frequentemente utilizada para referir-se a um conjunto de práticas sociais e culturais próprias da sociedade da informação que estão fortemente associadas às, ou mediadas por, tecnologias digitais. Estão incluídos neste conceito os diferentes tipos de saberes – conhecimentos, habilidades, atitudes, valores, etc. – que formam essas práticas. (p. 310)

Neste artigo, os autores vão dedicar os dois primeiros tópicos a explorar o conceito de alfabetização e alfabetização digital, partindo de conceitos que oscilam “de visões muito estreitas, que o identificam com a alfabetização em TIC, até interpretações muito amplas, que incluem competências e conhecimentos relacionados com âmbitos nos quais as TIC têm uma presença e um impacto importante, passando por sua interpretação como alfabetização como alfabetização em práticas letradas digitais ou alfabetização multimídia”. (p. 301)
Na parte introdutória do capítulo, os autores vão evidenciar o objetivo deste: “nosso propósito é analisar as necessidades de formação associadas ao conhecimento e domínio das TIC. O fato de levar em consideração estas novas necessidades formativas está na origem do conceito de alfabetização digital, que teve uma ampla difusão a partir da publicação do livro Digital Literacy por Gilster, em 1997, e que é normalmente utilizado para designar o conjunto de conhecimentos, habilidades e competências1 necessários para um uso funcional e construtivo das TIC”. (p. 289)
A escolha do termo “alfabetização” para referir-se a este conjunto de aprendizagens mostra sua importância. Com efeito, o termo refere-se originalmente à língua escrita e à cultura letrada, baseada na capacidade de ler e escrever; e, como é sabido, o texto escrito, a leitura e a escrita estão na base da educação escolar e do surgimento, consolidação e universalização dos sistemas estatais de educação, tal como os conhecemos atualmente. É claro que os aprendizados escolares não se limitam à aprendizagem da leitura e da escrita; fazer com que os alunos aprendam a ler e escrever é entendido como uma tarefa essencial da escola; fazer com que os alunos aprendam a ler e a escrever é entendido como uma tarefa essencial da escola, e o domínio da leitura e da escrita é necessário para que haja a possibilidade de se realizar outros muitos aprendizados, tanto na escola quanto fora dela. A alfabetização letrada remete, portanto, a um conjunto de aprendizados que podemos considerar básicos para todos os efeitos: uma vez que impregnam a atravessam todas as áreas do currículo, são uma condição sine qua non para realizar outros muitos aprendizados, condicionam as possibilidades futuras de educação e formação das pessoas e têm uma incidência direta sobre seu desenvolvimento pessoal, social e profissional. Falar em “alfabetização digital” equivale a postular que, assim como nas sociedades letradas é necessário ter um domínio funcional das tecnologias da leitura e da escrita para se ter acesso ao conhecimento, na SI é imprescindível ter um domínio das tecnologias digitais da comunicação e da informação – incluídas é claro, as tecnologias digitais de leitura e escrita. Em outras palavras, falar em “alfabetização digital” supõe aceitar, com todas as suas consequências, que as aprendizagens relacionadas com o domínio e manejo das TIC são básicas na SI no mesmo sentido emq eu já o são as aprendizagens relacionadas ao domínio da leitura e da escrita nas sociedades letradas. (p. 290)

O primeiro tópico intitulado “Perspectivas sobre a alfabetização” está dividido em dois subtópicos. No primeiro intitulado “o conceito de alfabetização”, os autores vão afirmar que existem múltiplas definições para o termo alfabetização e que este se rpesta a diversas interpretações.
  • Em um extremo, temos uma visão estritamente cognitiva e linguística da alfabetização entendida como a aquisição de um código – o sistema da língua escrita – e sua correspondência, no caso da leitura, entre o que está escrito e a palavra falada, e no caso da escrita, entre o que está escrito e o pensamento. O processo de alfabetização consiste, nesta perspectiva, na aprendizagem do código e do duplo sistema de correspondências. (p. 291)
  • No outro extremo, uma visão que introduz, juntamente com os aspectos cognitivos e linguísticos, a relação sócio-histórica e sociocultural da língua escrita e das práticas de leitura e escrita. É uma visão defendida por diferentes autores a partir de diversas perspectivas e tradições: a obra de Freire e sua concepção social e política da educação e da alfabetização; o trabalho de linguistas a partir de uma concepção social da linguagem; as contribuições de sociólogos, sociolinguistas e pedagogos que se aproximaram da compreensão do funcionamento da língua – principalmente da língua oral, mas também da língua escrita - como um fenômeno intrinsecamente social, e não apenas cognitivo ou linguístico; os estudos e contribuições realizados a partir de perspectivas piagetianas, vygotskianas ou neovygotskianas; ou ainda, a visão que considera a alfabetização como uma questão de política educacional. (p. 291)
  • a visão da alfabetização como prática ou, para sermos mais exatos, como um conjunto de práticas sociais vinculadas à produção, uso e circulação do que está escrito. O conceito de prática se contrapõe aqui à noção de performance – execução ou realização – e em geral, às concepções que veem a atividade humana como simples manifestação de uma estrutura preexistente. Segundo esta perspectiva, a leitura de um texto não é apenas uma atividade entendida como decodificação de um documento linguístico, uma vez que está sendo feito muito mais: trata-se de uma ação marcada e determinada culturalmente, na qual o sujeito leitor é transformado pela leitura, ao mesmo tempo em que se apropria do texto de uma maneira pessoal. Pensar em termos de práticas alfabetizadas ou letradas significa, portanto, prestar atenção tanto às diferenças individuais quanto às diferenças culturais que existem em cada prática, e não as colocar todas sob o rótulo comum de “leitura” ou “escrita”. (p. 292)

Juntamente com esta idéia da alfabetização como conjunto de práticas sociais vinculadas à “produção, uso e circulação do escrito”, convém mencionar outros dois traços amplamente compartilhados pelas interpretações que destacam a relação sócio-histórica e sociocultural da leitura e da escrita” (p. 292). São eles:
  • Alfabetização como capacidade ou competência, ou melhor, como um conjunto de capacidades ou competências suscetíveis de se manifestarem em práticas diversas por meio de múltiplas e diferentes realizações concretas. Ser alfabetizado significaria, segundo esse ponto de vista, ser capaz de participar de múltiplas práticas socioculturais mediadas pelo escrito, por meio de realizações ou execuções adequadas às características e aos contextos específicos de tais práticas. Cada prática alfabetizada tem um formato próprio (não é a mesma coisa por exemplo, ler um livro em um jornal, um anúncio e uma página web), e cada contexto específico apresenta exigências que também são próprias (não é o mesmo ler um texto científico com a finalidade de elaborar um relatório de pesquisa e ler a lista de compras do supermercado para não esquecer do que precisamos). (p. 292).
  • Alfabetização enquanto processo permanente - Com efeito, por um lado, a evolução social e tecnológica gera continuamente novas práticas letradas que impõem novas necessidades de alfabetização. De fato, como veremos mais adiante, a alfabetização digital pode ser entendida, e assim o fazem alguns autores, como uma consequência do surgimento de novos tipos de textos e novas práticas letradas associadas as tecnologias digitais. Por outro lado, é evidente que nossa capacidade para compreender, produzir e utilizar textos escritos varia consideravelmente em função das características dos textos e dos contextos concretos em que ocorrem as práticas letradas. É possível ser alfabetizado – ou ter um bom nível de alfabetização – em determinados tipos de textos e em certas práticas e, em compensação, não ser alfabetizado – ou não ter um bom nível de alfabetização – em outros textos e em outras práticas. Além disso, nunca atingimos, o ponto máximo final de alfabetização, nem sequer em relação a um tipo específico de textos ou de práticas. Sempre é possível continuar desenvolvendo e melhorando, em profundidade e em extensão, as capacidades e competências associadas à nossa participação nas práticas letradas (p. 293)

No sub-tópico intitulado “as novas alfabetizações”, os autores vão defender a existência de alfabetizações múltiplas e que “é cada vez mais frequente encontrar o termo alfabetização seguido de outro termo como qual se tenta limitar o especificar um tipo de alfabetização” (p. 294). Por exemplo: “alfabetização em TIC”; “alfabetização em redes”; “alfabetização em mídias”; “alfabetização comunicacional”; “alfabetização informacional”; “alfabetização digital”; “alfabetização científica”; “alfabetização tecnológica”; “alfabetização econômica”; “alfabetização ambiental”; “alfabetização em saúde”; “alfabetização visual”; “alfabetização emocional”; “alfabetização cívica”, etc.
Neste sentido, os autores vão apontar duas dimensões que precisam ser consideradas para o desenvolvimento do pensamento neste capítulo:
  • 1º A mudança conceitual que supõe falar em várias ou múltiplas alfabetizações, em vez de falar em uma alfabetização, está estritamente relacionada com a visão da alfabetização como um conjunto de práticas letradas e com a diversificação dessas práticas na SI; (p. 293)
  • 2º Quase sempre essa diversificação está estreitamente relacionada com as tecnologias da informação e da comunicação e com as características específicas dos textos eletrônicos e das práticas letradas em ambientes eletrônicos. (p. 293 e 294);

Para concluir esse segundo subtópico, os autores vão ponderar o seguinte:
Cabe utilizar o conceito de alfabetização em um sentido diferente do habitual, desvinculando-o totalmente da cultura letrada, para designar o processo por meio do qual as pessoas adquirem os conhecimentos e as competências necessários para se tornarem membros de um grupo que compartilha uma determinada cultura com tudo o que isso supõe. Talvez o uso do conceito de alfabetização neste sentido tenha uma certa utilidade do ponto de vista curricular, no sentido de se buscar identificar as aprendizagens fundamentais e as competências básicas em que deve estar centrada a educação escolar. É preciso reconhecer, contudo, que, frequentemente, algumas das assim denominadas “alfabetizações” remetem a pouco mais do que um conjunto de competências e saberes práticos em âmbitos específicos de experiência ou de conhecimento, o que definitivamente supõe um uso empobrecedor, além de incorreto, do conceito de alfabetização em qualquer um de seus significados. (p. 295)

O tópico intitulado “alfabetização digital”, está organizado em dois subtópicos. Em sua parte introdutória, os autores vão sustentar que:
O conceito de alfabetização, entendido como a capacidade para “fazer parte da cultura letrada” e “poder circular na diversidade de textos que caracteriza a cultura letrada”, amplia-se, assim, para outras capacidades: as relativas à aquisição dos conhecimentos e das competências necessárias para utilizar as tecnologias da informação e da comunicação. Uma vez chegados a este ponto, convém lembrar que o processo de alfabetização sempre comportou a aprendizagem e o domínio das tecnologias utilizadas para produzir, difundir, e ler os textos escritos: o lápis e o papel, o texto impresso, o livro ... Conforme estas tecnologias mudam – ou, para falar com maior propriedade, são ampliadas, dado que as tecnologias tradicionais não desapareceram e nada leva a supor que desaparecerão em um futuro próximo -, parece razoável incorporar o conhecimento e o manejo das novas ao processo de aprendizagem. Por outro lado, uma vez que as novas tecnologias situam a pessoa alfabetizada ante novos tipos de textos, novos tipos de práticas letradas e novas formas de ler e de interpretar a informação, todos esses aspectos passam a fazer parte da “expansão” preconizada do conceito de alfabetização, e, com isso, das exigências que comporta o fato de ser alfabetizado na sociedade da informação. Ocorre, contudo, que as tecnologias digitais não são apenas tecnologias para produzir leitura e difusão de textos escritos. Sua ubiquidade, sua progressiva incorporação a praticamente todos os âmbitos da atividade humana e sua capacidade para processar sons, imagens fixas e em movimento e sistemas de signos de todo tipo – além de textos escritos – conferem a elas uma centralidade e um protagonismo sem precedentes, se comparadas com as tecnologias anteriores. As tecnologias digitais não só incidem sobre as práticas letradas como também sobre outras muitas práticas nas quais a língua escrita divide o protagonismo com outras linguagens – visual, auditiva, audiovidual -, podendo chegar, às vezes, a ocupar um lugar secundário ou mesmo a estar ausente. Por isso então a proposta não apenas de ampliar o conceito de alfabetização letrada como de apelar diretamente para uma nova alfabetização, ao se falar no domínio funcional dos conhecimentos e habilidades necessários para utilizar tais tecnologias em um amplo leque de práticas sociais e culturais, independente do fato de que nelas o texto escrito, a leitura e a escritura possam continuar tendo, como de fato têm, com frequência, um papel fundamental. (p. 297 e 298).

No subtópico intitulado “as dimensões da alfabetização digital”, os autores vão trazer várias definições para o termo alfabetização digital:
  • Glister, em seu reputado e influente livro sobre o tema, define a alfabetização digital como “a capacidade para entender e utilizar informação em múltiplos formatos, a partir de uma ampla gama de fatores, quando esta se apresenta por meio de computadores”” (1997, p. 33) (p. 298)
  • Varis (2003), no marco de um trabalho sobre as novas formas de alfabetização e as novas formas de alfabetização e as novas competências requeridas pela aprendizagem on-line, retoma a definição de Glister e identifica cinco dimensões na alfabetização digital, algumas delas apresentadas, por sua vez, também como alfabetizações:
Alfabetização tecnológica: a capacidade de utilização de novas mídias, como a internet, para acessar a informação e comunica-laeficazmente;
Alfabetização informacional: a capacidade de recompilar, organizar e avaliar a informação e formar opiniões válidas baseadas nos resultados;
Criatividade midiática: a capacidade cada vez maior dos cidadãos de produzir e distribuir, onde quer que estejam, conteúdos para audiências de todos os tamanhos;
Alfabetização global: consiste em compreender a interdependência entre as pessoas e os países e ter a capacidade de interagir e colaborar eficazmente através das culturas;
Alfabetização responsável: a competência de examinar as consequências sociais dos meios de comunicação do ponto de vista da segurança, da privacidade e outros”. (p. 298)

  • Para Eshet, a alfabetização digital é um modo especial de pensar, uma mentalidade, com um componente fotovisual relacionado a leitura de representações visuais; um componente de reprodução relacionado a reciclagem criativa de materiais existentes; um componente de pensamento ramificado relacionado a hipermídia e ao pensamento lateral; um componente informacional relacionado a capacidade para avaliar e utilizar inteligentemente a informação; e um componente socioemocional relacionado à capacidade para compartilhar informações e realizar aprendizagens colaborativas mediante o uso de ferramentas e plataformas de comunicação digital”. (p. 299)
  • Pérez Tornero e colaboradores (2004), ampliam ainda mais o conceito de alfabetização digital e aponta que, neste caso, o termo “alfabetização” remete a leitura e à escrita somente de maneira metafórica. O uso da metáfora estaria justificado pelo fato de que , assim como ocorre na alfabetização “clássica”, também na digital os processos de aprendizagem têm um papel determinante e consistem basicamente na aquisição de uma “linguagem particular”. A partir dessa idéia, identifica quatro dimensões no processo de alfabetização digital:
Técnica e tecnológica: novos sistemas de instrumentos e máquinas;
Semiótica e comunicativa: linguagens complexas e novos sistemas de comunicação;
Ideológica: relacionada com os conhecimentos e ideias específicas da era digital;
Socioinstitucional: as relações sociais e as instituições que as organizam.
  • Rodríguez Illera (2004), por sua vez, questiona se existe um “núcleo de características diferenciais”, de “propriedades específicas” do que é digital, que justifique a alusão à alfabetização digital. Sua resposta é afirmativa, assinalando como características específicas a “digitalidade, a interatividade, a hipertextualidade, a multimidialidade, a virtualidade e a conectividade ou funcionamento em rede”. De todas elas o autor destaca a “multimidialidade”, uma consequência, por sua vez, da “digitalidade” e do caráter de “metamídia dos computadores”, ou seja, das facilidades que eles oferecem para codificar digitalmente informações que utilizam diferentes suportes – texto, som, imagens – e apresenta-las de maneira integrada.

Antes de apresentar uma última definição para o tema, os autores vão fazer a seguinte consideração: “o uso eficiente dos sistemas multimídia é, consequentemente, um dos ingredientes fundamentais da alfabetização digital” (p. 300). Diante de todas as definições apresentadas, os autores vão apresentar uma última para se contrapor.
  • Gutiérrez Martín (2003) defendem que a chave da alfabetização digital é: aprender a ler e escrever [...] documentos multimídia. A integração de textos sons e imagens fixas e em movimento que as tecnologias digitais tornam possível facilita, em sua opinião, “a criação de uma nova linguagem: a linguagem multimídia, cuja aquisição e domínio funcional e crítico para processar informação e transformá-la em conhecimento seria o objetivo último da alfabetização digital. Tal alfabetização, contudo, “não é somada à alfabetização verbal ou audiovisual, uma vez que passa a integrá-las, contribuindo com características próprias” (op. cit. p. 70) relacionadas com a integração de linguagens (possibilidade de criação de estruturas ramificadas em hipermídia) e com a interatividade (possibilidade de navegar pelas estruturas ramificadas). Consequentemente, para ser digitalmente alfabetizado não basta ser alfabetizado nas linguagens envolvidas – ou seja, na língua escrita, alfabetização letrada; som e imagem, alfabetização audiovisual. Além disso, é preciso dominar outros aspectos “relacionados à integração [de linguagens] e à interatividade” (op. cit. p. 100). (p. 300)

Após expor as definições trazidas na literatura, os autores vão manifestar as suas concepções acerca da Alfabetização Digital.
Por um lado, o componente alfabetização multimídia descansa sobre pelo menos outros três componentes relativos às linguagens de que ele faz parte e que podemos denominar alfabetização letrada, alfabetização visual e alfabetização audiovisual. Por outro lado, tanto a produção, compreensão e difusão de “textos” multimídia quanto os outros tipos de práticas que se apoiam nas tecnologias digitais exigem a aquisição de um conjunto de conhecimentos, habilidades e competências específicas relacionadas com o uso e com o manejo funcional e eficiente dessas tecnologias, o que nos remete inevitavelmente a outro componente, que podemos denominar, para simplificar, alfabetização em TIC. [...]. A alfabetização em TIC supõe muito mais do que aprender a manejar “mouses e teclados”; supõe, principalmente, aprender a utilizar as TIC tirando o máximo proveito das possibilidades que essas tecnologias oferecem o manejo da informação, para a comunicação e para a colaboração na abordagem de situações e problemas e no estabelecimento e conquista de objetivos pessoais no currículo escolar – embora frequentemente sua presença tenha sido mínima – resultam até tal ponto, transformados, modulados e enriquecidos pela incorporação dessas tecnologias que às vezes são apresentados como componentes da alfabetização digital, embora, segundo nosso critério, não possam ser considerados como tais em sentido estrito. É o caso, para dar apenas três exemplos evidentes, da alfabetização informacional, da alfabetização comunicacional e da alfabetização em mídias. (p. 300 e 301).

No subtópico intitulado “conhecimentos e competências da alfabetização digital”, os autores vão afirmar que em decorrências dessa multiplicidade de visões sobre o conceito de alfabetização digital, múltipla é também a diversidade de propostas para tal. Para fundamentar essa argumentação, o autor vai trazer propostas metodológicas e experiências de alfabetização digital divergentes que são oriundas de diferentes países.
No último tópico, intitulado “alfabetização, cultura digital e currículo”, os autores vão se posicionar frente ao currículo escolar à guisa de conclusão afirmando que:
A incorporação das TIC no currículo escolar não pode nem deve ficar limitada a que os alunos aprendam o funcionamento básico dos computadores e da internet e seu manejo e utilização como usuários dessas tecnologias. Como já vimos, uma das características mais importantes das tecnologias digitais é as possibilidade que elas oferecem para processar informação em diferentes formatos – som, imagens fixas e em movimento, linguagem oral, textos escritos – de maneira integrada. Essa característica, juntamente com outras associadas a ela – como a interatividade, a hipertextualidade e a multimidialidade – não apenas dão lugar a um novo âmbito de aprendizagem, inédito até agora, relacionado às competências, às capacidades e aos conhecimentos envolvidos na compreensão, produção e difusão de documentos multimídia. Além disso, tais propriedades estão na base de uma revalorização da linguagem visual e audiovisual e da necessidade de potencializar e reforçar sua aprendizagem; elas também influem no surgimento de novas formas de ler e de escrever, de novas práticas de leitura e de escrita que se desenvolvem em ambientes eletrônicos e que utilizam tecnologias digitais, o que obriga a ampliar o leque de contextos e práticas contempladas nos processos de alfabetização letrada. [...] Devido às possibilidades que essas tecnologias oferecem para representar, processar e difundir a informação e para a comunicação interpessoal e grupal, sua incorporação no currículo também tem repercussões importantes sobre a aquisição e o desenvolvimento das competências relacionadas ao manejo da informação, às relações interpessoais, ao trabalho em grupo e à participação em projetos coletivos. [...] As TIC não são um ingrediente a mais na SI. As TIC constituem o núcleo central em torno do qual se organiza o núcleo central se organiza o novo “paradigma tecnológico” associado a profundas transformações sociais, econômicas e culturais que caracterizam a SI. Com as TIC e a SI, o que está mudando são as práticas sociais e culturais que são a referência fundamental para a educação escolar. No atual momento, o desafio mais importante da educação escolar. No atual momento, o desafio mais importante da educação escolar é definir como enfrentar esta mudança cultural que a SI representa e que está sendo propiciada pelas tecnologias digitais, ou seja, definir como educar no marco de uma cultura digital. Educar no marco de uma cultura digital inclui a alfabetização digital, mas vai além: supõe ensinar e aprender a participar eficazmente nas práticas sociais e culturais mediadas de uma ou de outra maneira pelas tecnologias digitais. Do ponto de vista do currículo escolar, isso significa aceitar, com todas as suas consequências, que, apesar disso ser importante, não basta introduzir as competências, conteúdos e capacidades relacionados à alfabetização digital para enfrentar o desafio; é o conjunto do currículo que deve ser revisado a partir do referencial proporcionado pelas práticas sociais e culturais próprias da sociedade da informação, da leitura ética e ideológica que se faça delas e das necessidades formativas das pessoas neste novo cenário. (p. 306 - 307)

Ao final do artigo, os autores apresentam um glossário contendo as definições de alfabetização, alfabetização digital e cultura digital, além de disponibilizar links de instituições que trabalham com consultoria, pesquisa e práticas de alfabetização digital no mundo.

1 Na apresentação da parte IV, intitulada “O ensino e a aprendizagem de competências básicas em ambientes virtuais”, os organizadores vão definir o que entendem por competência: “conjunto de conhecimentos aprendidos para realizar apropriadamente uma tarefa, função ou papel característico de uma determinada prática em um cenário social”.

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